A
poesia, louca admirável, diz o que se adivinhava indizível, ninguém mais o pode
fazer, sem autorização cedida pela consciência, escapa-se dela, desconsidera-a
.
É
mal-educada com propósito e gaba-se disso.
A
poesia desarma as palavras bem-comportadas que se dizem nas prosas. Numa
conversa a duas, leva a melhor, com os argumentos de ser inteiramente genuína e
a outra rebuscada, uma monotonia chata, dormente, que nem sequer rima.
A
poesia dá piruetas no ar e isso é giro; acrobacias que assumem toda a
criatividade e isso é arte.
Os miúdos acham-lhe piada, ela dispõe os
adultos. Os cães sem entenderem o que nesses momentos se está a passar, com os
donos sob os efeitos alucinogénios da poesia, ladram. Querem dizer que estão contentes,
por os donos também gostarem da poesia, não eles, é o que lhes falta para serem
humanos.
A
poesia diz coisas sérias em frases curtas, um sentido prático da maior
abstração. Mas, a favor da sinceridade, a maior parte das vezes diz banalidades.
Enche livros e livros de banalidades, todos os dias.
E
é isso que os seus leitores querem: distração.
A
prosa não, tropeça nas palavras, amolece os leitores, bocejam. É boa para isso,
pouco mais, ainda que se arme em séria e credível.
Há
diferenças fundamentais entre os poetas e os prosadores.
Os
poetas são seres encantadores com quem não se pode viver em casa, desarrumam a
cabeça dos companheiros. São completamente imprevisíveis. De um nada qualquer,
sai um poema, o que altera o equilíbrio no convívio intimo das pessoas,
intromete-se onde não é chamado. Mas não se podendo viver com eles, ninguém se
imagina na falta deles- é um convite a ser nómada para quem foi toda a vida
sedentário.
Os
prosadores – a cara oposta - ajeitam os lençóis e põem as almofadas do sofá na
esquadria certa. Seres ideais, mas completamente sensaborões. São copos de
leite até ao fim da vida, apesar de poderem vir a escrever boas e enfadonhas
prosas.
Normalmente
os poetas não chegam ao fim das suas vidas a pagarem os seguros de saúde: fazem
tudo para chegar rapidamente ao fim da vida.
Os
outros, fazem planos poupança e reformam-se com as artroses a darem problemas
inimagináveis. Tal a magnitude do incómodo, que deixam de escrever, esquecem-se
que o fizeram.
Dão-se
por vezes a rir - rir apazigua as dores - se alguém lhes lê um pequeno poema.
Os
poetas não guardam rancores.
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