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A mostrar mensagens de dezembro, 2022

A BELEZA DE PALAVRAS BANAIS

Estende-se a palavra na folha de papel, e salpica-nos em novidades. Todos os dias sinto esse espanto, emoção primordial da união das palavras, que sem se saber como nem porquê, redesenham significados que nem sequer desconfiava, harmonias criativas, num concentrado de emoção. É isso a arte, ao qual sou alheio como criador. O meu trabalho, menor, é estendê-las a seu gosto na folha em branco, e nesse esforço, que por vezes não é pouco, elas encontram os seus enamoramentos, os seus casamentos, construindo de um caos aparente, um edifício poético, revestindo de lantejoulas e brocados a sua nudez inicial. Quando isto acontece, recosto-me no cadeirão de molas chiantes, envolvendo-me como o faz uma planta carnívora quando encerra sobre a presa as suas pétalas, eu no tal cadeirão, tão confortável como usado, e fico-me a admirá-las, realizado e cheio. Depois, fecho o caderno e não incomodo a sua intimidade – serei sempre um estrangeiro no meio delas - para que no recato do seu sossego, prossi

REDES DE CIRCULAÇÃO INTRINSECA DOS ORGANISMOS VIVOS *

  Não há maior prazer do que este. Não há palavras, não há asneiras, não há educação, deseducação, não há cores porque são todas ao mesmo tempo, não há uma música, muitas, melodias empolgantes, o mais complexo e inebriante bailado a que já assisti…sim meu amor, unimo-nos e esta primeira vez foi o pináculo, o auge, o inatingível ponto, conquistado, em que irremediavelmente, depois deste instante que não se vai repetir em intensidade e prazer, começamos a caminhar na direcção do jamais atingível. O orgasmo dos orgasmos….   dois corpos distintos e individuais unem-se num jogo de entrelaçados e intimidades. Pode ser a primeira vez que este encontro acontece com estes dois corpos. Numa organização, que se pode situar algures, mas sem certezas, nas cabeças em que estes dois corpos culminam, talvez seja aí, nada é certo, foram dadas essas ordens. Com uma frieza e racionalidade de máquinas. Como um centro de controlo de uma grande central energética, onde técnicos muito capacitados, olhando co

O LEITOR ATENTO

Costurava bilros com as palavras. O que para outros seria complicado, ele fazia-o com naturalidade. Não era um homem com estudos, se com isso se considerar a obtenção com maior ou menor esforço de diplomas e anos de resiliência, a aguentar os currículos bafientos e desinteressantes e os professores desmotivados, que não têm outras opções senão irem até velhos e depois, chegados aí, morrerem ou ficarem rapidamente apatetados e infantis. Moldou-se a si próprio. Aprendeu a compreender as palavras e depois estudou-as sozinho. No falar, foi uma pessoa contida, por natureza própria, e por essa característica sua, não necessitava de muitas palavras, as que usava no dia a dia, usava-as com segurança de quem sabia o que estava a dizer. A sua criatividade deixava-a fluir na escrita, a rédea larga. Não escrevia com nenhum propósito literário, e nunca teve sequer intenções de tentar uma novela. Era trabalho a mais e quando chegasse ao final, se chegasse ao final, já estaria cansado dos personagens