A preguiça é um bálsamo ou um impedimento. Normalmente os
preguiçosos dão-se bem sozinhos. Quando se juntam e dependendo do tamanho em
número do agrupamento, podem causar grandes estragos. Há, imagine-se, países só
de preguiçosos, continentes mais afeitos à preguiça do que outros.
Não se podem enumerar para não causar incidentes diplomáticos,
até porque há alguns que o sendo, não dão ao conhecimento, o que deixa os seus
vizinhos na dúvida, e deixam passar.
Esses países - como os preguiçosos em nome individual -
aceitam bem as esmolas, precisam delas, e os dadores têm-nos assim na mão, o
que explica a lei universal do equilíbrio de todas as coisas existentes: um dá,
outro recebe, e reina a harmonia.
Ela é um bálsamo porque desresponsabiliza o seu utilizador:
não poderá ser achacado de nada, nenhuma acção, boa ou má, conseguida, não conseguida,
já que se encontra em inação propositada desde pequeno ou desde que decidiu ser
assim.
Este tipo de preguiçosos – os balsâmicos - têm muitas vezes
tendência, para a crítica mordaz, ácida, desprezível e com isso vem-lhes um quê
de superioridade arrogante, advinda do facto de não fazerem nada. Sentem-se
deuses a apontar os erros e as imperfeições dos outros. Só não lançam
trovoadas, nem sequer faíscas frouxas, porque não têm esse dom concedido aos
deuses, semideuses, e ajudantes credenciados de ambos.
A preguiça também tem a outra face, tudo tem duas faces. A de
ser um impedimento. Ao ver-se na rua ou em qualquer lugar um preguiçoso, quem o
avista e identifica, sabe à partida que se encontra perante um indivíduo
inoperante, sem intenções. O preguiçoso está impedido por escolha pessoal de
vir a revelar o potencial de tudo o que poderia ser o seu potencial, neste caso
que é nada.
Há inúmeros exemplos de preguiçosos famosos. Em todos os ramos
do saber e do fazer, das Artes, das ciências, da Tecnologia, da Jurisprudência,
da Medicina, da Aeronáutica, da Politologia. No entanto, ficaram todos anónimos:
só foram famosos para eles próprios.
De vez em quando lá desponta um, a fazer-se de activo, mas ou
é descoberta a trapaça, ou o próprio, por exaustão imediata, desiste e volta ao
seu ponto de partida.
Esta lengalenga vem a propósito de o autor ter estado todo
o dia a olhar com uma enorme, voluptuosa, sensual preguiça, para uma folha de
papel em branco e se ter contentado em não fazer nada. Perdeu um dia quando
podia ter ido passear.
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