Uma estátua. Impávida como as estátuas sabem ser. Dão todos os sinais de ausência de vida, mas por vezes enganam. Há estátuas para as quais nunca olhamos e outras que não conseguimos afastar os olhos. Magnetismo sem explicação. As estátuas não têm substância e por isso tantos as desconsideram. A mulher tinha substância e podia ter sido estátua se tivesse calhado ser, à saída da bola na tômbola onde rolam as coisas e seres em potência de virem um dia a ser. Ela, ao lado da porta de uma conhecida loja de marca, fazia pender com a ponta dos dedos uma folha colada a várias outras folhas, para virem a ser maiores do que uma só. Na folha, explica por letra sua, ser uma artista sem trabalho. Ao lado, num recipiente pequeno mas suficiente, pequenas andorinha pregadeiras de belas cores e conjugações de distintos tecidos. Uma, à escolha, por uma moeda. Uma qualquer, não importa. Poucos leem a folha porque têm vergonha ou de si, ou dela, ou de ambos, ao ponto a que nos deixámos chegar. Recebe moedas mas poucos escolhem levar uma andorinha, belo símbolo de liberdade. A artista, que podia dar numa magnífica estátua, mas prefere ser humana, doí-lhe a alma as pessoas não considerarem as andorinhas, escolhendo uma. Não podia chorar porque estava a fazer de estátua. Em tudo ela é uma perfecionista apesar da impossibilidade de continuar artista
Comentários
Enviar um comentário