BEIJOS REPENICADOS E BONS
Os beijos têm muitas formas de se
beijarem, num espectro que vai do formal, ao familiar, ao amante, ao erótico, e
nas últimas das suas consequências e propósitos, nem sequer têm um nome porque
possam ser chamados.
A minha tia Custódia dava-os
repenicados e sonoros e era a sua especialidade. Nunca mais ninguém me deu
beijos assim, nem mesmo a minha prima, sua filha, que herdou o talento da mãe
para dar beijos repenicados.
Não posso dizer que tenha sido
sempre um apreciador desses beijos, e lembro-me longinquamente quando - por ser pequeno - estava preso aos
seus braços e ela desatava nesse frenesim de beijadela, sentia-me sufocar e não
compreendia as razões do seu desvario.
Essa manifestação quase exagerada,
mexia comigo, que sempre fui um delicodoce com muitas tendências para o amuo.
Ela deliciava-se e fazia jeitos de
grande felicidade e com o tempo – esse grande escultor - fui compreendendo que
esse seu exercício sonoro e de sucção compassada, era uma forma de me
acarinhar, e por isso amor.
E quando as pessoas nos faltam, é
que sentimos o vazio das suas representações neste palco que pisamos todos
enquanto por cá vamos entrando e saindo de cena.
Tenho muita saudade desses seus
beijos repenicados, e não vendo por aí ninguém a dar beijos repenicados como
ela, até porque não estou atento a esse fenómeno de intimidade familiar alheia,
e não ando a ver se os outros repenicam convenientemente ou não.
Agora que me lembrei desses beijos,
homenageio a minha tia, e a riqueza das coisas simples e prazerosas que adoçam
a memória das pessoas que amo.
Que repetidos e bons eram esses
beijos.
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