Num jardim,
no meio da cidade, não propriamente o meio, mas dizendo dessa forma se somos levados
a pensar com detalhe - um preciosismo -,
no jardim onde uma mulher lê livros e eu observo e denuncio, duas jovens quase
obesas comem saladas.
Elas são
jovens para isso e não parecem gostar de ser, a menos que estejam a enganar.
Essas
saladas acondicionadas em contentores de plástico comprados no chinês, foram confecionadas
pessoalmente, sendo fresquíssimas depois das alfaces terem vindo anteontem das
Filipinas e o ananás ter estado em trânsito na Islândia depois de ter sido
colhido há dez dias na Colômbia.
Elas estão
sentadas num parapeito e aparentemente satisfeitas, a contento da ordem pública,
conceito que não existe em democracia. Cada um faz o que democraticamente quer
sem ser multado.
Quem
acredita em teorias de conspiração, vê esses filmes até em minudências, e diria que
há uma conexão obvia entre as pessoas curiosas que estão em jardins ou noutros
lugares (para não se dedicarem a nada mais senão descreverem o meio que
observam, como se tudo fosse só deles), as pessoas absortas em lerem livros, e as
pessoas satisfeitas por comerem saladas. Este bouquet reunido, quer dizer alguma coisa, e esses teóricos,
agarram-se como lapas ao estudo das coincidências, até darem em doidos, se é
que não o são à partida.
Nenhuma
destas conjugações em sincronia, se reúnem com essa disposição de
contentamento, noutros ambientes senão nos jardins, levando a querer que os
jardins são locais de acontecimentos privilegiados e singulares.
E para dar
exemplos que não acontecem noutros lugares, veja-se:
Em nenhum
corredor, e muito menos desembocando, de chofre, na sala magna da Assembleia do
País, se pode dar nota de indivíduos ou individuas, empenhados a lerem livros,
mesmo sendo de teoria política. Não.
Observadores que captam o meio, não
existem. Os que existem nesse lugar captam-se a si mesmos, estão sempre a olhar
para um espelho inexistente mas que eles criam na sua mente saudável, a
verem-se só eles.
Comedores de saladas, da forma como estas raparigas fazem num
parapeito, nem um, apesar de elas aparentarem estarem muito felizes com as
saladas que confecionaram pessoalmente e agora comem, e haver legislação da
mais avançada no mundo e feita nesta casa, sobre o acto bom de se comer uma
salada.
Numa boa
empresa, com nome feito, marca, ou uma de inicio fulgurante (tentativa de tradução
rudimentar para “start-up”), não há empregabilidade nem necessidade de bons
observadores, tipo olheiros de nada em especial, se não ficarem especados a
observar coisas inúteis. Quer-se gente para trabalhar e não para estar a olhar
para o vazio.
Ler livros, é mal visto seja onde for, é um desvio que não se
quer nas empresas, que são sérias. Ler livros, amolece as pessoas para depois
executarem tarefas importantes.
Sobre as
saladas, são as mais consensuais das anteriores nomeadas, comem-se amiúde nos refeitórios,
ou em cima das secretárias de cada um.
Em outros
locais fechados de grande dimensão, é improvável acontecerem estas três
aberrações juntas. Não se está a ver em estações de Metro, em garagens
automóveis, em Matadouros municipais, e por aí fora.
Tudo isto
para levar onde? Para lembrar da impermanência das coisas do mundo.
A mulher que
lê livros não é para aqui chamada, um dia quando tiver cataratas deixará de ler e já de si é anónima, o que não é nada bom;
observadores e curiosos, há por todo o lado e são gente geralmente depravada;
as saladas, são alimentos muito saudáveis, mas isto muda todos os dias e amanhã
existe uma probabilidade de que sejam substituídas por panadinhos, alimentos
muito saudáveis, mais ainda do que as saladas., o que está ainda por descobrir,
mas em breve os cientistas vão dizê-lo.
Apesar de
não ser uma blogger do estilo, uma
influenciadora, não ter treze anos, não ser do sexo feminino nem aparentado,
não apreciar dar palpites sobre todas as matérias e ter milhões de seguidoras
que me endeusam, e não acreditar nas teorias da conspiração, estou em querer
que haver quem leia livros, observe os outros e os passarinhos com prazer, e se
comam muitas saladas, contribui para a diversidade, e no jardim que frequento gente
dessa e outra com outros interesses ,vêm à hora almoço apanhar sol e praticar
os seus prazeres pessoais.
Mas estou enganado!
Mas estou enganado!
As sonsas da alface, são espias a soldo de um município rival, que vieram disfarçadas de
gordas a comerem saladas em jardins públicos, para verem o que na capital se
faz para agradar aos turistas que nos visitam e também aos residentes fixos que
falam a mesma língua do presidente da Câmara.
Estão a ser pagas para absorverem ideias para implementarem essas
metodologias no seu sítio, elas não estão a comer saladas para deixarem de ser gordas.
A alface , o
livro e o mirone, não são randomizações do acaso, são casos de polícia, assim como o futebol que não é para aqui chamado.
Os conspirativos têm razão.
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