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AOS AMIGOS

 


É quase certo que vivemos uma só vida.

 Nesse tempo em que vestimos um corpo e somos animados por uma alma, na verdade, vivemos inúmeras vidas, imersos em ambientes vários, amigos vários, família, experiências e profissões. E é o juntar de todas essas pequenas vidas que fazem a nossa linha do tempo, a linha que nos leva do principio ao fim assinada com o nosso nome.

Depois de muitas peripécias, a maior e mais enriquecedora de ser pai, resolvi que chegava o momento de ganhar perspectiva. Uma visão panorâmica desta aventura mirabolante que é viver.

Para isso, decidi passar a minha pessoa como herói e protagonista principal de todos os episódios, para um papel de figurante, e sentar-me comodamente na poltrona, a assistir impávido e reconfortado ao andamento das coisas que me rodeiam, compreendendo-as, melhor ou não, assim o espero.

Passar a ser um observador dos cenários que se desenrolam diante mim, sem que eu estivesse no palco.

Para conseguir essa tranquilidade era fundamental distanciar-me também da grande cidade, do ruído constante, do sufoco dos ares poluídos, e procurei um lugar tranquilo e descomplicado onde pudesse desfrutar do silêncio, que tanto valorizo.

Trouxe-me um magnetismo que não lhe conheço o nome, até Figueiró dos Vinhos, onde nunca tinha estado, mal sabia onde ficava e não conhecia uma única pessoa, que eu soubesse, da terra.

E encontrei tudo o que procurava e também esse distanciamento, essa visão do todo, a perspectiva ampla, que acho importante para esta minha fase de vida em que considero começar os trabalhos de desprendimento, que nos preparam para a eternidade que temos pela frente.

Nisto, e sem o esperar, encontro a bela pacatez de uma pequena vila, aninhada em serranias cobertas pelo frescor de todos os verdes, sob a autorização dos azuis que pintam o céu, lugar que parece ter poderes hipnóticos, já que outros antes de mim, vieram de passeio e ficaram, a pintar a luz e a sombra.

E de repente, sem dar conta e surpreendido, vejo-me envolvido por novos amigos, improváveis , porque não sou pessoa de falar muito (agora até me estranho), que me adoptaram, e ganhando uma cumplicidade como se toda a vida estivéssemos estado juntos, desanuviados, alegres e brindando-nos, nas sextas-feiras do bar Pigalle, servidos pelo sorriso da Márcia, no seu pequeno bar que é o centro do mundo.

São pessoas únicas e genuínas, e sinto um privilégio por poder fazer parte deste Admirável Mundo Novo, em que estou a viver.

Estou a gostar de estar aqui, e hoje, sou eu que brindo a Vós.

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