Estarei a sonhar? Sonho
acordada? É real isto? Ou é uma realidade inventada pela minha mente que não
está bem? Não tenho respostas.
Habito num deserto. Um
deserto a perder de vista. Se isto é viver, pode ser, mas será viver no limite
do viver, onde quase viver não é mais possível, porque se está na fronteira. Um
pouco mais e a vida deixa de o ser, para ser uma outra coisa, que não sei como
chamar porque desconheço.
Somos uma dúzia de
famílias, somos nómadas permanentes. Sempre na procura de água, dos alimentos
frugalíssimos que nos mantêm vivos. Ocupamos tendas que mal nos protegem das
condições inumeráveis do clima. Inclemente, fatal. Viajamos em barcos que
navegam em terra, nas areias douradas do deserto, locomovidos pelo vento.
Direcionados por este quando enche as velas feitas de panos gastos.
A água, esse bem tão
precioso que não soubemos preservar, é o elixir da vida e é tão escasso. Umas
vezes falta-nos, outras, em que chove torrencialmente durante dias, uma água
salgadíssima fruto da evaporação dos mares, e que destrói tudo, nas suas
enxurradas demenciais.
Vivemos extremos de tudo,
a nova realidade.
Raramente encontramos
outros como nós que vagueiam para todo o sempre da sua existência, até que
acabe esta privação. Ou seria melhor dizer castigo?
Os nossos corpos são o
reflexo das condições que temos. Somos parte deste cenário e como tal, estamos carcomidos,
chupados, quase sem volume: uma pele ressequida sobre ossos precocemente
envelhecidos. Com um clima assim, a regra é mexermo-nos o mínimo e é o que
fazemos, ou seja, não o fazemos, jazemos ao abrigo das tendas a maior parte do
tempo, só saindo para o fundamental ou então, esgotadas as possibilidades do
não-lugar, para irmos em busca de um novo, que nos mantenha por mais algum
tempo, não sabemos se muito se pouco. Perdemos a conta do tempo, não temos como
o contar, e também não tem interesse.
Chegados aqui, não
deixaremos futuro. Não conseguimos preservar a nossa continuidade. Não há novas
crianças. Assim, estamos temporariamente todos mortos ainda nestas réstias de
vida. Gota a gota, esvaindo-se para o inefável nada. Sou uma das últimas que
nasceu quando as mulheres deixaram de ser férteis, porque ficaram velhas,
porque não se alimentam o suficiente para serem viáveis.
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