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“Quem nos deu olhos para ver os astros”






Reparo num interruptor desapercebido, modelo antigo. É um objecto a que não resisto, especialmente se me obriga ao descontrolo da vontade, à  curiosidade do que vai acontecer após o meu toque .
Não sei o que fazer. Não tenho a certeza até pela estranheza da situação, se estou desperto, dono de mim, ou num  sono profundo,

Numa situação normal, que não é, exploraria as possibilidades do botão. Sendo uma  situação pouco cómoda em que é bem possível estar a dormir - no enliço de morfeu - tudo se torna surreal e as conjugações de acções prováveis da minha opção, entram nas areias movediças de uma tomada de decisão.

Arrisco.

Não será grande a diferença se a cena está dentro ou fora da minha cabeça. Se estiver dentro, sou deus, se fora sujeito-me.

Sinto-me com coragem.

O  indicador da mão direita obriga-se a esse impulso irrevogável e movo o pinolete para baixo.

Olha!

O mapa do céu!

O silêncio das coisas longínquas perturba-me, mas o brilho das estrelas fragiliza-me. Fico pregado ao ecrã como um menino curioso.

Estou “num barco sem velas singrando um mar de fumo
mas descobrindo estrelas (1)”

As constelações que desenham desenhos na nossa imaginação piscam intermitentemente não luz mas palavras. A energia do cosmos em tamanho de letras góticas.

Aquela não é a Ursa Maior, a constelação que nos indica o bom caminho?

“O universo não é uma ideia minha.
A minha ideia do universo é que é uma ideia minha (2) ”, é o que diz.

O cruzeiro do Sul? Que raio de mapa este, aparecem todas elas, as estelas e não respeitam a sua própria geografia!

Amar, amar perdidamente (3)”, que bonito, esta marca os caminhos do amor ao sul, acolhedora direcção.


Começo a ficar à vontade.

Descubro a Apus, narcisa ave do paraíso; a Camelopardalis, a girafa; o Monoceros, o unicórnio que não existe.

Olha a Pictor, o pintor , o semi-deus da luz e da cor.

Demiurgo, inventariador dos meus caminhos, deitado de olhos fechados que abertos para dentro, a olhar desalmadamente para o céu que me fascina, criança irrequieta a laçar inquietações.

“e esta ansia de viver que nada acalma(3) , é o que me diz a grande constelação do oriente onde tudo nasce, até mesmo este deslumbramento.

Real? Irreal? Pouco importa,  deitado no chão a olhar para o céu deste espectáculo em que sou actor.


“Quem nos deus asas para andar de rastos?
Quem nos deu olhos para ver os astros
sem nos dar braços para os alcançar?(3)

Acordo e ausento-me deste sonho.Desperto vou continuar a olhar para o céu que ainda me falta azul para pintar uma das paredes.


Luis Robalo
Lisboa,Maio 2014


1.Cristovam Pavia
2.Fernando Pessoa
3.Florbela Espanca


INAUGURAÇÃO DIA 16 DE MAIO PELAS 19H00
 R.Maria da Fonte 54, Anjos,Lisboa









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