Sessenta e seis quadrados. Onze cinzento-nuvem carregada de
chuva, onze cinzento antracite, onze castanho cor de não se pode dizer o que
parece, onze menos castanho quase branco sujo. A contrapor tanta escuridão,
onze branco não totalmente sujo, ainda assim próximo, e finalmente, onze quadrados
amarelos, divididos em números iguais, seis, entre o amarelo sol vivo escaldo e
a limonada, mais suave.
O tapete da sala, estende-se sobre o chão em laje de tijoleira,
aos quadrados, talvez vinte por vinte centímetros. O contorno do tapete,
rebordo, acompanha a linha de união de uma fila de tijoleiras de forma a que o
conjunto chão-tapete, se encontram em harmonia de simetria.
Num dos seus quatro lados, o primeiro, o tapete de sessenta e
seis quadrados de lã de boa qualidade, alinha com a linha de fronteira como já
se disse da tijoleira estando esta por sua vez alinhada ao rebordo em PVC das
portas de vidro duplo com mosquiteiro que separam a sala de estar da varanda, o
dentro e o fora. O segundo dos quatro lados está alinhado com o saiote do sofá,
ou maple, este em tons de rato, uma definição difícil entre o cinzento e o
castanho, condicente com o tapete. Na esquina do segundo para o terceiro lado, pousa
um almofadão quadrado com aproximadamente trinta centímetros de altura e um
metro por um metro, de quadratura. Este almofadão tapa a esquina do tapete e
está forrado com um tecido com riscas lilás e outras mais finas rosa velho,
fazendo um contraste estranho com as cores do tapete e do sofá, ou maple. É
dissonante.
Por último, do terceiro para o quarto lado, na esquina, e
colocado em diagonal sobre a mesma, um objecto complicado de explicar e de
nomear. Não é um almofadão, nem um maple individual, nem um sofá-cama corrente.
É qualquer coisa que já foi moderna e multifunções que serve para sentar e
quando aberto em duas partes, oferece uma cama de corpo e meio.
Está forrado em tons de roxo, não conjugando este com o lilás do
almofadão, nem mesmo com o tapete e o maple, ou sofá, principal. Este objecto tem
também um rolo de espuma forrado num vermelho brilhante que cumpre o papel de
apoio lombar. O vermelho é brilhante e intenso e por ser assim, a harmonia do
conjunto compromete-se.
Estes objectos levam exactamente quinze minutos a ficarem
devidamente alinhados segundo a vontade do dono deste apartamento, que não
concede nem mais um minuto, a mais dos quinze, para executar a tarefa, porque
tem o tempo automaticamente interiorizado de todas as outras tarefas de
arrumação da casa quando termina o fim de semana e não se pode dar ao luxo de
perder minutos, já que tem mais coisas para fazer, num encadeamento delas que
nunca acabam e lhe consomem o tempo das vinte e quatro horas, pegando umas às
outras sem descanso.
Durante a semana a casa vai ficar desabitada, completamente
fechada de qualquer raio de luz insidioso, protegida com uma cortinas “blinder”, negras, feitas e cosidas para
esse efeito, obedecendo a medidas exactas e rigorosas das janelas, de modo a
não sobrar nenhuma linha ténue de luz, que penetre e venha a causar o fenómeno
conhecido por “comer” a cor das coisas, deixando-as pardacentas e com um ar
gasto, velho, consumido.
Nesse espaço de tempo de cinco dias aproximadamente, formar-se-á
uma camada fina de poeira a cobrir o tapete, o sofá, o almofadão e o objecto
inqualificável, o que vai obrigar no próximo fim de semana, quando chegarem, e
depois de porem as coisas no frigorífico, a uma limpeza atenta para tornar o
apartamento habitável.
Tudo isto deve acontecer como calculado, antes de incorporarem o
espirito do fim de semana, da liberdade, do relaxamento, da preguiça, tudo,
claro está, com o seu peso e medida e contenção, porque quando mais se
desarrumar, mais terá depois de se arrumar.
Pelo sim pelo não, é melhor não se mexerem muito, um fim de
semana passa num instante e se estiverem sossegados descansam mais
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