CARTA A PEDRO SANTOS GUERREIRO I - Semanário EXPRESSO
Assunto: Panama Papers – 17 Agosto 2016
Caro Pedro Santos Guerreiro,
Desculpe-me a devassa de lhe entrar assim, de rompante, sem um
doutor, um professor doutor, com uma ligeireza a parecer deselegância no tracto.
Os títulos atrapalham-me (eu sei, é um problema meu), prefiro a descomplicação
dos nomes, facilita a comunicação, reduz distâncias, anula hierarquias e
altares.
Venho à fala consigo para pedir a gentileza de me fazer o ponto
da situação relativamente àqueles papelotes que tanto anunciou em tempos
recentes. Uns papeluchos escaldantes, prometendo confissões escandalosas (o que
me pelo por um bom escândalo!)
Julguei perceber que era uma enorme papelaria, a ocupar muito
espaço, resmas e resmas.
Os seus persistentes anúncios, puseram-me curioso, e aguardei a
roer as unhas até que fosse feita a revelação prometida (e quem promete, se é
cumpridor, da palavra, paga).
O tempo passou, entrámos na silly
season (cá por mim que ninguém nos ouve, acho que estamos nela vai para
séculos), e nada. Já ganhámos um europeu de matraquilhos, os fogachos andam a
fazer das suas, e quanto à papeleta, népias! (que é uma palavrota meio
desconxavada, mas gosto dela).
Pergunto-me: será que teve o descuido de deixar a janela do seu
escritório aberta, e numa diatribe do vento, o papelame se pôs a fazer de
pássaro, a voar para a liberdade, para onde não pode ser apanhado?
Compreendo a sua frustração - eu próprio também estou nesse
estado -, tanta novidade a dar, e ela a escapar-se pelos interstícios de uma
janela descuidada.
Se ao menos tivesse escrito alguns nomes num caderno, que nos
pudesse revelar, só uns, meia dúzia!?
Caro Pedro, agora que somos conhecidos, não levará a mal que de
vez em quando me chegue à palavra, a saber notícias suas, cumprimentando-o, e
quem sabe um dia destes novos papiros venham pousar na sua mesa de trabalho, e
em falando consigo, peço notícias sobre esses conteúdos, picantes certamente.
Venham daí esses ossinhos, e caso seja apropriado, votos de umas
boas férias.
NOVA CARTA A PEDRO SANTOS GUERREIRO II - Semanário EXPRESSO
Assunto : Panama Papers – 21 Agosto 2016
Estimado Pedro,
Agora que nos escrevemos – só eu ainda para si - tratemo-nos sem
formalismos.
Cá estou eu de novo à fala – neste caso muda – a saber notícias
dos papéis.
Como não disse nada, não respondeu a minha missiva, fiquei
preocupado. Disse até para a minha Maria: “Ou foi de férias, ou anda a apanhar
papéis.”
Por mim não vale a pena ficar nervoso, eu espero, desde que me
responda e me diga o que sabe sobre o assunto em apreço.
O ter dado a cara, a forma assertiva como o vez, revela coragem,
e não me passa pela ideia que tenha esmorecido. Não o vejo a ceder a pressões,
tenho-o em conta e grande decência.
Só podem ser as férias!
O pézinho de molho, a aragem com salpicos de sal, a sardinha, a
“jola” fresquinha, não há como as férias, esquecemos tudo, até as coisas que
nos arreliam.
Fico à espera de notícias suas e as outras. Se me quiser contar
as aventuras dos miúdos, aprecio, que é sinal da nossa recente amizade. Agora,
o que eu queria mesmo, mesmo saber era notícias do Panama.
Se não for antes até para a semana.
Respeitosamente,
AINDA MAIS UMA CARTA A PEDRO SANTOS GUERREIRO III - Semanário
EXPRESSO
Assunto: Panama Papers – 26 Agosto 2016
Eu sabia que não tinha razão, pus-me com nervoseira, e estas
coisas de investigação jornalística, levam o seu devido tempo. Não é de pé para
a mão que se revelam notícias deste calibre. Têm que ser devidamente sopesadas,
passadas pelos crivos da verosimilhança, da verdade, da concordância, do
alinhamento. Tantas variáveis a exigirem rigor, precisão, clareza,
oportunidade.
Eu a insistir consigo, já a dizer que tinha deixado
distraidamente a janela do escritório aberta, e que os papéis se tinham posto
ao caminho de voarem dali para fora, quase a culpá-lo disso. Do silêncio, de
não dizer mais nada durante um tempo que me parecia uma eternidade, e o meu
amigo, educadamente, a aguentar estoicamente os meus perdigotos.
Afinal o que esteve a fazer este tempo todo foi a escarafunchar
no papelório, a tirar mais sumo, matéria clara de condenação, a ligar as
coisas aos nomes, ou ao contrário o que dá no mesmo.
E hoje, acordando eu com a bílis a dar para o torto, já a afinar
as facas a quem zurzir antes de ir de fim-de-semana para a minha casa na
Herdade da Comporta, eis que dou de caras, escarrapachado, logo no página
primeira, com uma bela de uma notícia do Panama: “ A mina de diamantes
com ligações offshore” do malandro do israelita Benjamin Steinmetz.
Descomprimi, voltei a acreditar na humanidade. Tudo o que já
passava em loop por esta minha enviesada cabeça é um desvario
meu. Os Panama são para serem revelados ”sem apelo nem agravo, nem pedido de
amigo”. Hoje foi este caso, amanhã serão casos portugueses, que os há (diz-se),
e o meu estimado amigo que os sabe, só espera que a justiça dê vazão às resmas
de papelotes dos processos do BPN, Sócrates e quejandos, para quando os vir
mais folgados (aos juízes) dar-lhes esses nomes jeitosos que tem para que eles
iniciem os longos, peregrinos, de desfecho imprevisível, processos.
Obrigado Pedro, agora sim: venham dai esses ossinhos!
A ÚLTIMA CARTA A PEDRO SANTOS GUERREIRO IV - Semanário EXPRESSO
Assunto: Panama Papers
– 5 Setembro 2016
GOSTARIA DE VER PORTUGUESES ENTRE OS MELHORES NOS PANAMA PAPERS
Amigo Pedro,
Está bonzinho? Deveria dizer bronzeadinho? Espero que sim, a
face com uma boa cor dá outro realce à alma, um glamour interior,
uma certa luminescência.
Temos novidades dos papéis? Vi que publicaram pelo menos duas
histórias: a do israelita e os seus brilhantes negócios dos diamantes, e a
conta do GES (uma de tantas), tão complicada a história, que
penso que lá para o terceiro parágrafo já me estava a perguntar qual era o tema
da notícia.
Penso que é a este jogo de complicações que se dá o nome de
“Engenharia financeira”, uma verdadeira arte.
Desculpe a insistência de querer à viva força (expressão mais
linda!) saber de cidadãos nossos envolvidos nestas histórias. É um impulso
patriótico que me impregna, uma vontade de ver reconhecido o nosso nome além-fronteiras,
para que não se diga quando há coisas destas em grande estilo, que nós nunca
aparecemos porque somos pequeninos e tímidos, incapazes de figurar na primeira
linha.
Não senhor! Tímidos talvez, mas se a isso impulsionar o engenho
e a vontade, temo-los tão bons ou melhores engenheiros que qualquer outro, da
Papua Nova Guiné às ilhas Faroe.
Peço-lhe portanto amigo Pedro, que me vá mantendo informado, e
mesmo que não me diga nada, eu respeito: há muita gente, boa e de pergaminhos
imaculados, que não é dada a convívios com estranhos e só abraçaram a carreira
jornalística, porque na altura não puderam ser produtores de mirtilos (não
sabiam como aceder aos fundos).
Confio, que mais mês menos decénio, teremos notícia com
substância, a colocar no devido lugar de destaque e pódio, os brilhantes
portugueses envolvidos na primeira divisão mundial do campeonato da fina
manigância.
Até lá, com muito apreço, e até – posso dizê-lo –, algum carinho
que este nosso recente contacto avivou, despeço-me no anelo de ver uma palavra
sua. Afinal já merecemos uma notícia de jeito sobre o assunto em epígrafe.
Apreciadamente, considere-me um fiel leitor,
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