Conheço-o mas não sei o nome. São os nomes que me falham, os
rostos não. Os nomes têm letras e são essas que me entontecem. São muitas, não
as junto bem. Quando me abordam, os rostos, não sei o que dizer. A cabeça para,
fico a observar, a ver no que vai dar. Abordam-me com simpatia, eu queria ser
educado, mas não sai nada.
Por vezes, desbloqueia-se um encadeado de letras, saem com uma
velocidade inaudita, e digo-o, desanuvia-me. Mas o rosto que fiz o favor de lhe
dar um nome, não gosta.
Contrapõe com perguntas inconvenientes. “Quem é ele?”,
“Como se chama?”, “Graus de parentesco?” Nesses momentos fico cansado, enervo-me,
perco o controlo das letras, e para não ser inconveniente, olho, só olho, de olhos
bem abertos, sem nada para dizer.
Ainda ontem, deve ter sido ontem, estava a tratar de uns
assuntos importantes com a minha mãe, na cozinha, coisas da morte dela e do
funeral que não gostou porque teve pouca gente, estavam também uns amigos do
Gás que entraram pelas escadas dos canos por baixo daquela coisa que deita água
para lavar pratos, e entra uma cara que está sempre a aparecer, que eu conheço,
mas não sei como se chama. Não me deixou falar mais. Pôs-me uma coisa na boca e
mandou-me para a cama.
Ficámos ali os dois, eu deitado e ele sentado ao meu lado, sem
dizermos nada, ele com um ar carregado, eu a olhar para o tecto, a gostar de
olhar para o tecto.
Como conheço aquela cara, acabei por ficar meio alterado com a
sua tristeza.
Não lhe disse nada porque não me apeteceu estar para ali a
deitar letras, fiquei de olhos arregalados.
Puseram-me uma coisa na boca, sabe bem, sou feliz.
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