Sentados em fila no banco corrido da paragem de autocarro, todos rodam a cabeça ao mesmo tempo, repetem o movimento: para um lado, para o outro. Varrem o campo de visão imbuídos numa pequena ansiedade. Imitam os bonecos de plástico que se vendem nas lojas dos chineses – quando se compram fazem-se vaticínios para quando vão deixar de funcionar. Alguns duram muito, é como as pessoas. Quem vê ao longe os que ocupam esse banco incómodo na paragem desagradável da noite, imagina-os silenciosos, congelados na posição de sentados. A pista de que existe naquele cenário um sinal de vida adivinhável, que não é uma instalação artística de ambiente urbano, hiper-realista, é poder-se comprovar a realidade de uma linha de olhos alinhados pestanejantes, que vasculham a chegada da carrinha das sandes. Os proprietários dos olhos que são assinalados neste banco, todas as noites, à mesma hora, os mesmos e às vezes alguns mais, são um bando de putos traquinas fingidos de bem comportados.