O pianista que toca piano no grande, alto, branco, frio, barulhento, hall do hotel, toca piano inutilmente. Toca e mal se ouve, não se ouve. Passa gente constantemente, com pressa para entrar, ou sair, para um lado e outro, um qualquer, não interessa, muitos, apressados e faladores. A porta é giratória pelo que gira, estonteantemente. O tráfego nos elevadores é um piscar de luzes e portas a abrirem e fecharem. Acumulam-se malas, umas melhores. Em condições normais o pianista não precisaria de tocar piano só para si. Teria audiência. Toca, mas o automático movimento dos seus dedos mesmo que premindo teclas inexistentes no ar, em que local seja, seria suficiente para ele ouvir música, que lhe vem de dentro. O homem que é pianista e tem um fato decente escuro e gravata formal, tudo isto inutilmente, está ali, porque o valor do gás, da electicidade, da água cada vez mais proibitiva, não lhe dá tréguas. Por esses motivos fortes, invisível aos olhos dos outros, t